Período chuvoso e aumento de demanda causou o crescimento, segundo comerciantes.
De R$ 600 para R$ 1,2 mil. Esse foi o aumento na compra de mil unidades de tijolos numa das lojas de material de construção mais populares de Salvador, O Fazendão, em Cajazeiras. O aumento de 100% não é exclusivo da empresa do seu Gilberto Cerqueira, 60 anos. O CORREIO entrou em contato com pelo menos 10 lojas de material de construção de sete cidades baianas, e confirmou não só o crescimento do valor do produto, como também a sua falta.
“Blocos? Não temos. Estou com oito páginas de clientes aguardando o produto chegar. O fornecedor diz que vai chegar na próxima semana, é a nossa previsão, mas ele sempre diz isso e não entrega. A gente fica só aguardando… estamos vivendo um cenário complicado e estressante”, disse Claudia Azevedo, gerente da Torres Materiais de Construção, localizada em Cajazeiras.
“Eu não sei qual loja de Salvador tem bloco atualmente, pois faço parte de um grupo em que todos estão com esse problema”, completou Azevedo. O grupo em questão é o da Associação dos Comerciantes de Material de Construção da Bahia (Acomac-BA), cujo presidente, Geraldo Cordeiro, confirma a falta do material.
“Como estamos num período chuvoso, isso dá impacto direto na cerâmica. As empresas têm dificuldade para extrair o barro na chuva e também a madeira, que é usada na queima dos blocos, não pode estar molhada. Mas também junta a isso o aumento do consumo do produto nessa pandemia. O setor está registrando um aumento geral de 10% nas vendas”, disse.
Das cinco empresas de Salvador procuradas pela reportagem, somente a Construa Barato, da Mata Escura, disse ter o bloco. O local vende somente por delivery. “A gente teve que encontrar um bom fornecedor que fica na divisa da Bahia com o Espírito Santo. Por ser mais em conta, tô vendendo o milheiro por R$ 1,060 mil, mas já cheguei a vender por R$ 1,2 mil”, disse o dono da loja, Tom Sampaio.
Fábrica
O dono da Cerâmica Santos, de Livramento de Nossa Senhora, centro-sul baiano, afirmou que esse é o primeiro reajuste de preço dos blocos em 12 anos, o que foi possível pelo aumento de demanda. “Sempre nós vendemos aquilo que estava no patamar da produção e hoje nós temos uma demanda que não conseguimos suprir. Produzimos cerca de 600 mil peças por mês e continuamos nessa produção máxima, mas não podemos passar disso”, afirmou.
Já em Luis Eduardo Magalhães, no extremo oeste, um aumento de quase 100% no preço do produto foi registrado pela Oeste Material de Construção, que também está com o produto em falta. “Eles ainda estão entregando um pedido de 40 dias de atraso e que vai direto para os clientes que encomendaram”, afirmou o dono da loja, Luciano Araújo. Lá, o valor do milheiro saltou de R$ 420 para R$ 800.
Em Barro Preto, cidade vizinha de Itabuna, no sul da Bahia, a Marcosta Materiais de Construção também está sem blocos. Lá o aumento no preço foi menor: saltou de R$ 500 para R$ 650, segundo o gerente Wildson Bernades Guimarães. “Em Itabuna, vejo que o valor vendido pelo setor é ainda maior: R$ 800”, disse.
Em Feira de Santana, esse crescimento no preço dos blocos foi tão expressivo que Jorge Morais, dono da Massa Fina Material de Construções, decidiu parar de vender o produto há três meses. “É um produto que necessita de uma logística muito grande e o preço tá alto, chega a ser constrangedor para o cliente, que está fazendo a obra e precisa terminar. Antes eu vendia por R$ 500 e, se ainda continuasse a vender, seria com um aumento de 90%”, afirmou.
Outros materiais
Quem é dono de loja de material de construção não reclama apenas da falta e do aumento do preço de tijolos. “Eu estou há 35 dias sem blocos na loja, mas também não tenho inox, Se tivesse todos os itens, o movimento seria bem melhor”, explica Giovanni Argolo, gerente da O Fazendão, loja de Cajazeiras. “O tempo de espera do PVC está de 45 dias. Hoje, eu não tenho uma porta sanfonada e uma vara de tubo de 100 para oferecer ao cliente”, reclamou Claudia Azevedo, da Torres Materiais de Construção.
Em Lauro de Freitas, Marcio Nascimento, dono da Construpiso, diz que o maior problema da sua loja são fios e cabos. “Não consigo encontrar. O preço subiu muito. O mesmo é com piso e revestimento”, afirmou. Já em Barreiras, Marizete Azevedo, dona da Casa Santa Luzia, relata seu drama: “tá faltando cimento, telha, ferro de todos os tamanhos e tipos, e piso. Está muito difícil trabalhar”.
Para Rosivaldo Califa, dono de uma loja de materiais de construção de Itabuna que leva o seu sobrenome, o aumento na demanda fez com que as fábricas tivessem dificuldades de fornecer os produtos. “As lojas de roupa estavam fechadas e as pessoas não tinham onde gastar dinheiro. Aí vieram gastar com a gente. O povo ficou em casa e começou a reformar”, disse.
A consequência da falta de mercadoria é o aumento dos preços, registrado por todos os comerciantes entrevistados. “Eu acho que vai ter que ter a mão do governo para frear isso, pois tá tendo muito aumento”, defende seu Califa. A verdade é que, mesmo com o crescimento dos preços, o aumento nas vendas do setor é constatado.
“Na região de Feira de Santana o aumento de vendas foi de 12%. Já em Itabuna e região cacaueira foi 10%, que é a média do estado. Agora a região campeã foi a do centro-oeste baiano, também influenciado pelo bom momento vivido pelo agronegócio baiano: 18% de crescimento”, afirmou Geraldo Cordeiro, presidente da Acomac-BA.
O fornecimento do auxílio emergencial é apontado pelo setor como um fator que ajudou no aumento das vendas, “principalmente nas periferias das cidades e regiões do interior. As pessoas reservaram parte desse dinheiro para fazerem simples melhorias em suas residências”, disse Geraldo. O pedreiro Carlos Pereira, que trabalha em cajazeiras, diz não perceber aumento na demanda. “Eles só chamam para coisas mais urgentes”, disse, ao explicar que, para ele, essas obras são feitas pelos próprios moradores.
Mais emprego
Mesmo em plena pandemia do novo coronavírus, Salvador registrou em julho a criação de 439 empregos formais no setor da construção civil, segundo dados divulgados nesta segunda-feira (24) do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho. Além do segmento, outra área que obteve resultado positivo foi a da indústria, com 34 postos gerados.
“Temos que comemorar esses resultados, que são frutos de muito trabalho da Prefeitura para reativar a economia. Vínhamos numa velocidade enorme de geração de emprego e, apesar da crise causada pela Covid-19, não diminuímos os investimentos em infraestrutura para melhorar a condição da cidade, bem como manter os postos”, explica o titular da Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Urbanismo (Sedur), Sérgio Guanabara.
“Como forma de minimizar os impactos causados pelo coronavírus, procuramos evoluir com parcerias privadas e estipulamos metas de emissão de alvará para que as obras não parassem. Sofremos muito, mas temos trabalhado com propósito firme de recuperar os níveis de emprego. Um exemplo disso é o plano de estímulo a diversos segmentos da economia local, composto por 101 ações inovadoras para o desenvolvimento da capital”, acrescenta Guanabara.
*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro
Fonte: Jornal Correio.